As síndromes hipertensivas, especialmente a pré-eclâmpsia, e a prematuridade complicam em torno de 2 a 8% e 10% de todas as gestações no mundo todo, respectivamente. E são responsáveis por significativa morbimortalidade materna e fetal.
Trabalhar na sua prevenção tem um impacto importante no cenário obstétrico e neonatal, evitando esses desfechos desfavoráveis e reduzindo os custos em saúde. Desde 2011, a OMS indica a suplementação com 1.500 a 2.000 mg ao dia em gestantes com baixa ingesta de cálcio para profilaxia de pré-eclâmpsia.
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Foi publicado, recentemente, no periódico The New England Journal of Medicine, um artigo trazendo o resultado de dois ensaios clínicos desenvolvidos na Índia e na Tanzânia. O objetivo foi avaliar a não inferioridade da suplementação com baixa dose de cálcio (500 mg) em relação à alta dose (1.500 mg), durante a gestação em nulíparas, quanto ao desenvolvimento de pré-eclâmpsia e parto pré-termo.
Metodologia
Foram desenvolvidos dois ensaios clínicos de randomização individual na proporção 1:1, duplo cego em duas localidades, Índia e Tanzânia. Foram incluídas gestantes com menos de 20 semanas, nulíparas e maiores de 18 anos. Após consentimento, foram alocadas em 2 grupos diferentes, um recebendo 500 mg de cálcio ao dia e outro recebendo 1.500 mg.
O desfecho primário foram o diagnóstico de pré-eclâmpsia e de parto pré-termo (abaixo de 37 semanas). Os desfechos secundários foram relacionados a morbidades como hipertensão arterial gestacional, baixo peso ao nascer, óbito fetal e outros.
Resultados
Um total de 11.000 gestantes nulíparas foram incluídas em cada ensaio. A incidência cumulativa de pré-eclâmpsia foi de 3,0% no grupo de 500 mg e 3,6% no grupo de 1.500 mg no ensaio da Índia (risco relativo, 0,84; intervalo de confiança [IC] de 95%, 0,68 a 1,03) e de 3,0% e 2,7%, respectivamente, no estudo da Tanzânia (risco relativo, 1,10; 95% IC, 0,88 a 1,36) — achados consistentes com a não inferioridade da dose mais baixa em ambos os ensaios.
A porcentagem de nascidos vivos prematuros foi de 11,4% no grupo de 500 mg e de 12,8% no grupo de 1.500 mg no estudo da Índia (risco relativo, 0,89; 95% IC, 0,80-0,98), que estava dentro da margem de não inferioridade de 1,16; no estudo Tanzânia, os respectivos percentuais foram de 10,4% e 9,7% (risco relativo, 1,07; 95% IC, 0,95-1,21), o que excedeu a margem de não inferioridade.
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Conclusões e mensagem final
A suplementação de cálcio pode reduzir a pressão arterial, reduzindo a liberação do paratormônio e o cálcio intracelular, resultando em redução da contratilidade da musculatura lisa vascular. Por meio de mecanismo semelhante, a suplementação de cálcio também poderia reduzir a contratilidade da musculatura lisa uterina e prevenir o trabalho de parto prematuro.
Nesses dois ensaios, a suplementação de cálcio em baixas doses não foi inferior à suplementação em altas doses em relação ao risco de pré-eclâmpsia. Não foi inferior em relação ao risco de nascimento prematuro no ensaio na Índia, mas não no ensaio na Tanzânia.
O regime de suplementação de cálcio em altas doses atualmente recomendadas pela OMS exige a tomada de 4 suplementos nutricionais por dia (cálcio 3 vezes ao dia mais 1 suplemento diário de ácido ferro-fólico ou multivitamínico), o que pode diminuir a adesão. Além disso, o custo de um regime de suplementação de cálcio de 3 comprimidos excede em muito o custo aproximado da dose de 500 mg.
A opção de regimes de baixa dosagem podem contribuir para diminuir custos e aumentar a adesão.
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Autor
Doutor em Ciências Médicas pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) ⦁ Professor no Curso de Medicina da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo (FOB-USP) ⦁ Professor no Curso de Medicina da Universidade Nove de Julho de Bauru (UNINOVE).
- Dwarkanath P, Muhihi A, Sudfeld CR, Wylie BJ, Wang M, Perumal N, Thomas T, Kinyogoli SM, Bakari M, Fernandez R, Raj JM, Swai NO, Buggi N, Shobha R, Sando MM, Duggan CP, Masanja HM, Kurpad AV, Pembe AB, Fawzi WW. Two Randomized Trials of Low-Dose Calcium Supplementation in Pregnancy. N Engl J Med. 2024 Jan 11;390(2):143-153. DOI: 10.1056/NEJMoa2307212. PMID: 38197817.