Condição caracterizada por sintomas e complicações que persistem por pelo menos 12 semanas após a resolução da infecção inicial. Os sintomas da covid longa podem variar e incluem fadiga, dispneia, dor torácica, artralgia, confusão mental e outras manifestações neurológicas e psicológicas. Um estudo brasileiro recente avaliou a proporção de adultos com covid longa no Sul do Brasil e os fatores associados a essa condição crônica.
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Metodologia
Maiores de 18 anos, residentes no Rio Grande do Sul, foram recrutados por meio de quatro abordagens diferentes: mensagens, compartilhando com contatos pessoais e profissionais em todo o estado, campanhas nas redes sociais, mídia local e agências estaduais e professores e alunos da Universidade ligada ao estudo.
Foram utilizados dados da quarta onda (ocorrida em junho e julho de 2022). No total, 2.545 indivíduos participaram da coleta e 1.001 relataram resultados positivos em PCR ou testes rápidos de covid. Os participantes que relataram teste positivo para covid receberam uma lista de sintomas (por exemplo, fadiga, tosse, dor de cabeça) e foi solicitado que relatassem quais haviam experimentado. Com base nesses dados, a covid longa foi definida como qualquer sintoma relacionado à Covid por pelo menos três meses.
Apenas sintomas com prevalência ≥ 20% foram considerados para análise. Problemas de memória e concentração, irritabilidade, depressão e ansiedade foram agrupados sob o termo “complicações neurológicas”.
Achados
Três em cada quatro participantes desenvolveram covid longa duração após serem infectados pelo SARS-CoV-2. Fadiga, complicações neurológicas, dores de cabeça, tosse, perda de cabelo e perda de olfato e paladar foram os sintomas persistentes mais relatados.
Participantes do sexo feminino tiveram maior probabilidade de desenvolver covid longa que os do sexo masculino, conforme observado em estudos anteriores. Dentre as explicações citadas temos o fato de o stress psicológico ser mais prevalente nas mulheres e ter sido associado ao desenvolvimento de sintomas pós-covid.
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Além disso, as mulheres apresentaram maior percepção que a covid é uma condição de saúde. Por último, estudos prévios também mostraram que o agravamento da ansiedade, depressão e distúrbios do sono devido à pandemia de covid foi maior nas mulheres que nos homens e que fatores relacionados com o surto, como o isolamento social e a inatividade física, podem exacerbar o risco de doença pós-covid em mulheres.
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Da mesma forma, observamos que os participantes que recebiam até um salário-mínimo e aqueles que ocupavam posições ocupacionais instáveis (ou seja, estudantes) tinham maior probabilidade de relatar sintomas neurológicos persistentes, tosse e queda de cabelo, o que corrobora o papel da vulnerabilidade social e econômica na covid longa. Além disso, a atividade física foi associada a menor probabilidade de fadiga, complicações neurológicas, tosse e dores de cabeça, corroborando achados anteriores.
Esse estudo foi o primeiro a revelar uma relação dose-resposta inversa entre as doses da vacina e a covid longa no Brasil. Um esquema vacinal incompleto foi associado a uma maior probabilidade de covid longa que um esquema completo.
Os participantes que não foram vacinados contra a covid ou que receberam até duas doses da vacina tiveram, respectivamente, 23% (IC95%: 1,08; 1,41) e 8% (IC95%: 1,01; 1,18) mais chances de desenvolver covid longa que aqueles que tomaram três a quatro doses.
Além disso, foi observado que os adultos que foram hospitalizados devido à covid tinham maior probabilidade de desenvolver covid longa que aqueles que não foram hospitalizados, mas outros estudos sobre este tema forneceram resultados conflitantes. Fatores como as diferenças entre os sistemas de saúde entre os países podem explicar a heterogeneidade nessa associação. Por exemplo, os sintomas relacionados com a covid, como a falta de ar, são mais bem controlados em indivíduos hospitalizados que em indivíduos não hospitalizados.
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No entanto, tempos de espera mais longos para hospitalização devido à precariedade do sistema de saúde, que foi comum durante a fase mais aguda da pandemia de covid, especialmente em países de renda baixa e média, podem levar a um desenvolvimento mais grave destes sintomas.
Esse estudo também demonstrou que adultos com doenças crônicas, como hipertensão e diabetes, tinham maior probabilidade de apresentar covid de longa duração. Isto apoia resultados anteriores de revisões sistemáticas e meta-análises. Em contraste, o consumo ocasional de álcool estava associado a uma menor prevalência de complicações neurológicas e dores de cabeça após a infecção pelo SARS-CoV-2.
Isso provavelmente ocorre porque condições cardiometabólicas, como obesidade e diabetes, podem criar uma condição pró-inflamatória que promove a persistência da inflamação e dos sintomas relacionados por mais tempo, aumentando assim o risco de covid longa. Por outro lado, o baixo consumo de álcool diminui o estado inflamatório do organismo, o que poderia explicar a associação protetora entre o consumo ocasional de álcool e a covid prolongada. No entanto, deve-se notar a incerteza das evidências sobre os efeitos pró-inflamatórios e anti-inflamatórios do consumo de baixas doses de álcool.
Comentários
O principal ponto forte desse estudo é fato de ser o primeiro a estimar o número de pessoas que vivem com covid longa no Brasil e os fatores associados a essa condição em adultos. No entanto, o estudo também apresenta algumas limitações que devem ser reconhecidas. Primeiro, a infecção por covid foi autorrelatada pelos participantes. Também não foi investigada a presença de covid longa em pacientes assintomáticos, o que provavelmente subestimou a verdadeira prevalência da doença. Outra limitação é que o desenho transversal utilizado não permite inferência causal entre os fatores analisados e a covid longa. Por último, o fato de terem utilizado um questionário online para conduzir a pesquisa pode ter resultado em viés amostral.
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Autor
Médica do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/FIOCRUZ ⦁ Mestrado em Pesquisa Clínica pelo Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/FIOCRUZ ⦁ Infectologista pelo Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/FIOCRUZ ⦁ Graduação em Medicina pela Universidade Federal Fluminense
- Feter N, et al. Prevalência e fatores associados à COVID longa em adultos do Sul do Brasil: achados da coorte PAMPA. Cadernos de Saúde Pública. 2023;39(12). DOI: 10.1590/0102-311XEN098023