A presença de sintomas persistentes ou de sequelas subagudas de covid-19, denominada de covid longa, tem sido cada vez mais reconhecida e estudada nos últimos anos. Estudos do CDC norte-americano encontraram que 15% de todos os adultos nos EUA apresentaram sintomas de covid longa 3 meses depois da infecção.
A ocorrência de covid longa tem sido associada à gravidade da infecção, a qual, por sua vez, tem associação com a variante do SARS-CoV-2. Por outro lado, tem-se poucas informações sobre a ocorrência de Covid longa e o impacto da vacinação em seu desenvolvimento em infecções leves e moderadas.
Um estudo publicado na Open Forum Infectious Diseases procurou avaliar a influência da vacinação contra Covid-19 no desenvolvimento de covid longa em uma coorte de pacientes ambulatoriais, com casos que não necessitaram de internação hospitalar.
Materiais e métodos do estudo sobre covid longa
O estudo utilizou dados de participantes da coorte IASO, que, desde 2020, inclui indivíduos com 18 anos de idade ou mais que são funcionários ou estudantes da Universidade de Michigan. Cada voluntário permanece na coorte por 1 ano, podendo ser convidado a continuar sua participação anualmente. Avaliação de sinais e sintomas respiratórios foram conduzidas semanalmente e exames laboratoriais, a cada 2 meses.
Casos de covid-19 foram definidos como os tendo um teste — molecular ou de antígeno — positivo, independente da presença de sintomas. Voluntários que relataram a presença de sinais e sintomas respiratórios foram encorajados a procurar a Universidade para realização de testagem. Para identificação de casos não reportados, os resultados dos testes realizados na Universidade foram revistos semanalmente. Os participantes com um diagnóstico de covid-19 foram convidados a realizarem testagens subsequentes semanalmente até obterem dois testes negativos, além de fornecer amostras de sangue 3 a 4 semanas após o início da doença.
Os dados em relação à vacinação contra covid-19 foram obtidos a partir de questionários individuais com os participantes, registros médicos da Universidade e o registro de vacinação do estado de Michigan. Em caso de discrepâncias entre os registros, os participantes foram solicitados a apresentar documentação da vacinação.
Todos os participantes com diagnóstico de covid-19 sintomática receberam questionários sobre sinais e sintomas de covid longa 30 dias após a infecção. Os questionários tinham perguntas referentes a presença, duração e gravidade (mensurada em uma escala de 1 a 10) de 15 sintomas frequentes em episódios de covid-19: dor de garganta, congestão nasal, tosse, mialgia, febre/sensação de febre, fadiga, calafrios, dispneia, pressão torácica, distúrbios do sono, perda de paladar, perda de olfato, cefaleia, distúrbios gastrointestinais e disfunção cognitiva. Os voluntários foram questionados sobre a ocorrência e característica desses sintomas durante a infecção aguda e 30 dias após. Para os que ainda se apresentavam sintomáticos, os questionários foram enviados mensalmente até resolução.
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As exposições analisadas incluíram o status vacinal anterior à infecção (suscetível – sem infecção e sem vacinação prévias —, não vacinados com infecção prévia, entre doses de vacina, e breakthrough infections — vacinação completa ≥ 14 dias antes da infecção). Para os com breakthrough infections, foram consideradas outras exposições: variante Ômicron (para infecções após 25 de dezembro de 2021) vs. variantes pré-Ômicron, tempo desde a última vacina (≥ 6 meses vs. < 6 meses) e presença de infecção prévia vs. sem infecção prévia.
Resultados
Entre outubro de 2020 e dezembro de 2022, foram incluídas 3.375 pessoas na coorte IASO, representando 5.094 pessoas-ano. Nesse período, 1.691 casos de covid-19 foram identificados e eram elegíveis para o questionário de sintomas de covid longa. Desses, 1.370 (81%) completaram os questionários. A maioria dos participantes tinha entre 35 e 55 anos (10 – 82 anos; mediana de 44,3 anos) e era mulher (84%). Somente 10% dos casos necessitaram de tratamento ambulatorial e 1%, de hospitalização.
Durante a fase aguda, 93% dos participantes relataram sintomas e 74% relataram ≥ 5 sintomas. Com 30 e 90 dias após a infecção, 38% e 13% relataram a presença de sintomas e 6% e 2% relataram ≥ 5 sintomas, respectivamente. Os sintomas mais frequentes na fase aguda foram fadiga (79%), congestão nasal (75%) e cefaleia (66%). Com 30 dias após a infecção, os sintomas mais comumente relatados foram fadiga (19%), tosse (15%) e disfunção cognitiva (12%) e, aos 90 dias, perda de olfato/paladar (8%), fadiga (6%) e disfunção cognitiva (5%). Dispneia, considerado o sintoma mais grave, esteve presente em 19% dos casos na fase aguda, em 6% aos 30 dias e em 2% aos 90 dias. A gravidade dos sintomas relatados não diminuiu com o tempo, permanecendo semelhante durante o período em que estavam presentes.
Noventa dias após a infecção, 8% dos indivíduos vacinados ainda apresentavam pelo menos um sintoma, comparado com 27% dos indivíduos não vacinados. A presença de qualquer sintoma aos 30 e 90 dias foi 37% e 69% menos comum em pessoas vacinadas, respectivamente (RR = 0,63 IC 95% = 0,52 – 0,76 e RR = 0,31; IC 95% = 0,22 – 0,42). A presença de ≥ 5 sintomas foi 63% e 66% menos comum nos vacinados contra covid-19 com 30 e com 90 dias, respectivamente (RR = 0,37; IC 95% = 0,24 – 0,58) e RR = 0,34; IC 95% = 0,15 – 0,79). Durante a fase aguda, não houve diferença na presença de sintomas entre os grupos de vacinados e não vacinados. A gravidade média e máxima dos sintomas também foi significativamente menor em todos os momentos de avaliação.
Analisando sintomas específicos, indivíduos vacinados tiveram mais sintomas relacionados ao trato respiratório inferior, porém esses foram menos graves. Dispneia foi 46% menos frequente na fase aguda, 58% menos frequentes aos 30 dias e 75% menos frequente aos 90 dias em vacinados em comparação com não vacinados (RR = 0,54; IC 95% = 0,42 – 0,70, RR = 0,28; IC 95% = 0,18 – 0,44 e RR = 0,25; IC 95% = 0,12 – 0,55, respectivamente). Outros sintomas também foram menos frequentes 30 e 90 dias após a infecção em indivíduos vacinados, tais como mialgia, fadiga, calafrios, distúrbios do sono, perda de olfato/paladar, cefaleia, distúrbios gastrointestinais e disfunção cognitiva.
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Pela possibilidade de influência devido à variante responsável pela infecção nas diferenças encontradas, as análises foram realizadas considerando um período pré-Ômicron e um período de predominância da variante Ômicron. Para as variantes pré-Ômicron, não houve diferença estatisticamente significativa entre vacinados e não vacinados para a presença de sintomas em todos os pontos de avaliação. Novamente, a frequência de dispneia foi menor, de sintomas do trato respiratório superior foi maior e a gravidade dos sintomas foi menor em todos os momentos de avaliação para indivíduos vacinados, porém houve menos diferenças significativas.
Os voluntários vacinados que tiveram infecção no período de dominância da Ômicron apresentaram a menor prevalência de sintomas aos 90 dias após a infecção: 6% comparados com 18% nos vacinados e com infecção por outras variantes. A presença de qualquer sintoma aos 30 e aos 90 dias foi 43% e 64% menos comum em vacinados no período da Ômicron do que em vacinados no período pré-Ômicron (RR = 0,57; IC 95% = 0,44 – 0,74, e RR = 0,36; IC 95% = 0,22 – 0,59), respectivamente.
Outro ponto de análise foi se infecções subsequentes em pessoas vacinadas seriam menos graves e com menor probabilidade de desenvolvimento de covid longa. Não houve redução na prevalência e nem na gravidade dos sintomas na segunda infecção em indivíduos vacinados.
Mensagens práticas
- Nessa coorte, vacinação contra covid-19 esteve associada a com menos sintomas de covid longa e menor gravidade de sintomas.
- No geral, 13% dos participantes dessa coorte ainda apresentavam sintomas 3 meses após a infecção de covid. Esses números são compatíveis com os encontrados em outros estudos. A proporção de sintomáticos foi menor em indivíduos vacinados (8%) e os menores índices foram encontrados em indivíduos vacinados infectados com a variante Ômicron (6%).
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Autor
Infectologista pelo Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (UFRJ) ⦁ Graduação em Medicina na Universidade Federal do Rio de Janeiro
- Maier HE, et al. Reduction in Long COVID Symptoms and Symptom Severity in Vaccinated Compared to Unvaccinated Adults, Open Forum Infectious Diseases. 2024;11(Issue 2):ofae039. DOI: 10.1093/ofid/ofae039