Manejo de problemas neurológicos em crianças sob VMID em domicílio

O crescimento da população mundial de crianças sob ventilação mecânica invasiva em ambiente domiciliar (VMID) nos últimos anos tem sido atribuído aos progressos nos cuidados intensivos e ao aprimoramento nas taxas de sobrevida.  

Dessa forma, a utilização dessa modalidade terapêutica emergiu como um suporte respiratório essencial em longo prazo para crianças com distúrbios neurológicos. Entretanto, demanda proficiência técnica avançada e uma atenção constante durante as 24 horas do dia.

Veja também: Metanálise avalia impacto da hiperóxia na sobrevida de pacientes em ECMO-VA

Além disso, o manejo de questões neurológicas em crianças sob VMID exige uma abordagem integrada e abrangente, aspectos que foram minuciosamente explorados no recente artigo “Management of neurological problems in children on home invasive mechanical ventilation“, publicado na revista Pediatric Pulmonology e sintetizado a seguir.  

VMID

Distúrbios neurológicos e VMID 

Os distúrbios neurológicos podem causar fraqueza muscular respiratória, redução da capacidade pulmonar e ventilação prejudicada, dificultando ou impossibilitando a respiração espontânea. A VMID pode ser usada no tratamento de vários distúrbios neurológicos, particularmente atrofia muscular espinhal (AME), distrofia muscular, paralisia cerebral, distúrbios do tronco cerebral, lesões da medula espinhal ou distúrbios neurodegenerativos progressivos.  

Avaliação inicial 

Normalmente, envolve uma avaliação completa do estado neurológico e respiratório do paciente, histórico médico e comorbidades. É crucial realizar uma avaliação abrangente que englobe testes de função pulmonar, análise dos gases sanguíneos e revisão das configurações atuais do ventilador.

Além disso, é imperativo levar em consideração a capacidade do paciente de tolerar o modo de VMID, avaliando elementos como o suporte oferecido pelo cuidador, a personalização dos planos de cuidados e a compreensão do cuidador em relação à tecnologia envolvida.

Essa avaliação holística visa adaptar a VMID de maneira específica às necessidades individuais da criança, assegurando a prestação de cuidados respiratórios e promovendo a melhoria da qualidade de vida. Por fim, a criação de um ambiente doméstico seguro e limpo é vital para medidas de controle de infecções.  

Escolha do modo ventilatório 

A escolha entre ventilação mecânica invasiva (VMI) e não invasiva (VNI) depende da gravidade da insuficiência respiratória, de condições médicas específicas e da capacidade do paciente de tolerar diferentes modos ventilatórios.   

Técnicas de desobstrução das vias aéreas 

​Técnicas como fisioterapia respiratória, dispositivos de auxílio à tosse e aspiração são essenciais para prevenir infecções respiratórias em crianças em uso de VMID.  

Suporte nutricional 

Garantir nutrição e hidratação adequadas nesses pacientes é fundamental para manter a saúde geral e as funções respiratórias. Distúrbios do SNC caracterizados por movimentos involuntários excessivos, como distonia e coreoatetose grave, podem levar a um aumento da necessidade de ingestão calórica.  

Follow up 

Acompanhamento de rotina com o pediatra geral, pneumologista pediátrico e neurologista pediátrico são fundamentais para avaliar a eficácia da ventilação, manejar possíveis complicações e especificar o plano de cuidados. Além disso, é essencial uma comunicação e colaboração regulares entre profissionais de saúde e demais cuidadores.   

Apoio psicológico e educacional 

Devem ser fornecidos não somente para o paciente, mas também para seus cuidadores (deve ser dada especial atenção à prevenção de burnout do cuidador e à identificação precoce dessa condição). 

Principais problemas neurológicos e tratamentos especiais em crianças em VMDI 
Complicações da imobilização 
  • Triagem de rotina para identificação dessas complicações;
  • Fisioterapia efetiva;
  • Tratamento específico de acordo com a complicação;
Convulsões/ Convulsões prolongadas 
  • Tratamento de manutenção: combinação de medicamentos anticonvulsivantes;
  • Tratamento de resgate para convulsões prolongadas: Diazepam retal (gel), midazolam intranasal/bucal. 
Coreoatetose (movimentos involuntários) 
  • Ácido valproico, carbamazepina, clonazepam, haloperidol, olanzapina, pimozida, risperidona, tetrabenazina.  
Desnutrição e problemas nutricionais 
  • Dieta apropriada: calorias e proteínas suficientes e não excessivas;
  • Suplementação nutricional apropriada. 
  • Suplementação de vitaminas e de oligoelementos. 
Distonia (movimentos involuntários) 
  • Baclofeno, benzodiazepínicos, clonazepam, difenidramina, estimulação cerebral profunda,  gabapentina, técnicas não invasivas de neuroestimulação, toxina botulínica, triexifenidil. 
Distúrbios do sono 
  • Intervenções comportamentais;
  • Suplementação de ferro;
  • Clonazepam, clonidina, gabapentina, melatonina, ralmeteon, trazodona. 
Dor 
  • Tratamento direcionado de acordo com a doença de base; 
  • Analgésicos simples, antidepressivos tricíclicos, gabapentina, opioides e benzodiazepínicos. 
Problemas psicossociais 
  • Suporte e aconselhamento psicológico; 
  • Prevenção de burnout no cuidador; 
  • Acompanhamento psiquiátrico para a avaliação de medicamentos psicoativos. 
Sialorreia 
  • Benztropina, glicopirrolato, injeção de toxina botulínica A, patch de escopolamina/hioscina, sulfato de atropina sublingual,  triexifenidil; 
  • Tratamento cirúrgico: desvio ou ligação do ducto salivar. 
Treinamento cognitivo e seus desafios 
  • Encorajar a presença na escola ou integração na comunidade. 
  • Educação escolar em casa. 

Saiba mais: SCCM atualiza diretrizes de controle glicêmico em crianças sob cuidados intensivos

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Autor

Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra

Referências bibliográficas:
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  • SAYAR, Yavuz; YILDIRIM, Miraç; TEBER, Serap. Management of neurological problems in children on home invasive mechanical ventilation. Pediatr Pulmonol., 2023. DOI:10.1002/ppul.26830.


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