As doenças cardiovasculares (DCV) são altamente prevalentes e, apesar dos benefícios conhecidos dos programas de reabilitação cardíaca, apenas 25% dos pacientes que tem indicação são encaminhados para esse tipo de tratamento. Recentemente, a NEJM publicou uma revisão sobre o assunto. Abaixo seguem os principais pontos.
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Definição
A reabilitação cardíaca, também chamada de reabilitação cardiovascular, consiste em uma abordagem personalizada, multidisciplinar e sistemática com o objetivo de prevenção secundária baseada em evidências para pacientes com DCV.
História
A reabilitação cardíaca teve início na metade do século XX devido à necessidade de cuidado dos sobreviventes de infarto agudo do miocárdio (IAM), que tinham alta morbimortalidade. Na ocasião, havia poucas opções terapêuticas e os pacientes tinham restrições à realização de atividade física por pelo menos seis semanas após o evento.
Por volta de 1950, começou-se a observar que pacientes internados por IAM poderiam realizar alguns tipos de exercício com segurança e benefício. Assim, começou-se a introduzir atividade física progressiva no cenário da terapia intensiva e, após, a reabilitação cardíaca começou a ser realizada no cenário ambulatorial, onde se viu que pacientes com angina estável tinham melhora do consumo de oxigênio com cargas de exercício repetidas.
Com o surgimento de mais evidências em relação ao benefício e segurança, os centros de reabilitação cardíacos para prevenção secundária foram se expandindo cada vez mais e ganhando espaço.
Objetivos da reabilitação cardíaca
Atualmente, o objetivo do programa de reabilitação cardíaca é que o paciente atinja a melhor saúde cardiovascular possível. As principais indicações das diretrizes para realização de treinamento com exercícios supervisionados são para os pacientes com angina estável, insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida, pacientes com IAM, revascularização coronária cirúrgica ou percutânea e transplantados cardíacos. Além disso, também pode ser indicado para pacientes com doença arterial periférica.
O ideal é que o treinamento se inicie após 1 a 2 semanas do evento, prazo que está associado a melhor aderência do paciente ao programa e a melhora de desfechos. O início em até 15 dias da alta tem 67% de melhora na capacidade do exercício comparado ao início a partir de 30 dias da alta.
Funcionamento
O paciente é avaliado em relação ao seu histórico cardiovascular, medicações e doenças associadas, fatores de risco cardiovasculares, hábitos e capacidade de exercício, dieta, composição corporal e qualidade de vida. Essa avaliação é feita por equipe multidisciplinar composta por médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, nutricionistas, assistentes sociais e psicólogos e o tratamento é individualizado para cada paciente. O plano de tratamento é revisado e atualizado a cada 30 dias.
Os objetivos da reabilitação também são individualizados e a ideia é o paciente alcançar boa saúde cardiovascular, além de atingir as metas de tratamento com controle de hipertensão arterial, lipídios, peso, glicose e exposição a tabagismo. Também objetiva auxiliar no manejo de condições associadas, incluindo alterações psicológicas, limitações musculoesqueléticas e apneia do sono.
Os pacientes sempre são avaliados antes, durante e após o exercício em relação a sintomas e sinais vitais e pacientes com condições instáveis devem ser estabilizados antes do treinamento.
O padrão são 36 sessões de uma hora por um período de 12 semanas. Essas sessões incluem treinamento com exercícios, aconselhamento nutricional, educação e suporte psicológico de acordo com o plano individual do paciente.
Após as 12 semanas, os pacientes passam por um processo gradual com reavaliação de seus objetivos e metas após a alta. Também se desenvolve um planto de seguimento de longo prazo para o cardiologista ou clínico que seguirá o paciente.
Benefícios da reabilitação cardíaca
Os benefícios incluem melhora da capacidade funcional, saúde mental, aderência ao tratamento, controle de fatores de risco cardiovasculares, retorno ao trabalho e melhora da qualidade de vida, que resultam em redução das taxas de readmissão hospitalar e mortalidade cardiovascular.
Uma revisão sistemática mostrou que para reduzir 1 IAM é necessário tratar 75 pacientes e para reduzir uma internação é necessário tratar 12 pacientes. Dados observacionais sugerem que para evitar uma morte após angioplastia é necessário tratar 34 pacientes em 1 ano e 22 pacientes em 5 anos.
Já o risco é muito baixo, com ocorrência de 1 parada cardiorrespiratória a cada 1,3 milhões de pacientes-hora de exercício. As análises de custo-benefício também favorecem o programa.
Dificuldades da reabilitação cardíaca
Apesar dos benefícios conhecidos, a participação dos pacientes ainda é baixa. Nos últimos anos, essa participação tem aumentado, porém apenas um quarto dos pacientes elegíveis são encaminhados e uma pequena parte completa o programa todo. A participação é menor ainda entre mulheres, idosos, grupos com menor poder aquisitivo e algumas minorias étnicas. Algumas dificuldades são na implementação dos centros de reabilitação e aumento da capacidade dos centros já existentes, principalmente em relação a custos.
Alternativas
Além dos centros de reabilitação, programas de exercícios em casa também têm sido implementados, com a diferença apenas do local. A equipe utiliza meios de comunicação como chamadas por telefone, vídeo ou outras formas de mensagem durante o exercício (comunicação síncrona) ou fora desse período (comunicação assíncrona), ou ainda de forma híbrida.
Isso pode beneficiar pessoas que não conseguem participar de atividades no centro de reabilitação e a aderência parece ser maior, provavelmente por ser mais conveniente para os pacientes. O custo-efetividade também parece ser favorável, porém ainda há algumas pendências como definir padronizações, regulações e o pagamento dessa modalidade.
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Comentários e conclusão
A reabilitação cardíaca tem tido um grande desenvolvimento nos últimos anos e novas estratégias de intervenção e ferramentas interativas, como os “wearables”, monitores fisiológicos e dispositivos de comunicação terão grande papel nos próximos anos.
Além disso, pode ser que outros grupos também se beneficiem, como pacientes com doença cardiovascular e câncer coexistentes, pacientes com insuficiência cardíaca e fração de ejeção preservada, fibrilação atrial e doenças congênitas.
Também existe um papel da reabilitação pré-doença cardiovascular seu papel, ainda em desenvolvimento. Mas o principal no momento é conseguir entregar esse tratamento para todos os pacientes elegíveis.
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Autor
Editora de cardiologia do Portal PEBMED ⦁ Graduação em Medicina pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) ⦁ Residência em Clínica Médica pela UNIFESP ⦁ Residência em Cardiologia pelo Instituto do Coração (InCor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) ⦁ Atualmente atuando nas áreas de terapia intensiva, cardiologia ambulatorial, enfermaria e em ensino médico.
- Thomas RJ. Cardiac Rehabilitation – Challenges, Advances, and the Road Ahead.