Em neonatologia, o ibuprofeno (inibidor da enzima ciclooxigenase) pode ser usado para tratar a persistência do canal arterial (PCA) em bebês prematuros.
Partindo da hipótese de que, entre pacientes com PCA > 1,5 mm de diâmetro com fluxo irrestrito identificado com o uso de ecocardiograma à beira do leito, um grupo de pesquisadores avaliou se o tratamento seletivo precoce (≤ 72 horas após o nascimento) com ibuprofeno reduziria a mortalidade e melhoraria os desfechos em curto prazo, como displasia broncopulmonar (DBP), em maior extensão do que o placebo.
Metodologia
O Baby-OSCAR consistiu em um ensaio clínico randomizado (ECR) multicêntrico, duplo-cego, controlado por placebo realizado em 32 Unidades de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) no Reino Unido. Os pacientes elegíveis eram bebês nascidos entre 23 semanas e 0 dias e 28 semanas e 6 dias de idade gestacional (IG), < 72 horas de vida, com um diagnóstico de PCA grande confirmado por ecocardiograma e para os quais não havia preocupações clínicas associadas à hipertensão arterial pulmonar (HAP) aguda.
Um PCA grande foi definido como um PCA com diâmetro de, no mínimo, 1,5 mm e fluxo pulsátil transductal irrestrito (shunt da esquerda para a direita). O ecocardiograma transtorácico foi realizado para avaliar a elegibilidade dentro de 72 horas após o nascimento e às três semanas (18 a 24 dias) de idade para avaliar a patência do PCA, minimizando o tratamento aberto. Para controle de qualidade, uma amostra de ecocardiogramas de 65 crianças foi revisada de forma independente por um ecocardiografista pediátrico que desconhecia as atribuições do tratamento.
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A intervenção do estudo foi o ibuprofeno sódico, e o placebo correspondente foi uma solução estéril transparente de cloreto de sódio a 0,9%. De julho de 2015 a dezembro de 2020, os pacientes foram randomizados em uma proporção de 1:1 para um dos dois grupos (“ibuprofeno” e “placebo”) para garantir o equilíbrio em relação ao tamanho do PCA, IG ao nascimento, idade, sexo, local do ensaio, se o nascimento era múltiplo, modo de suporte ventilatório e uso de inotrópicos. Bebês de nascimentos múltiplos foram submetidos à randomização individualmente. O ibuprofeno foi administrado por via parenteral como uma dose de ataque de 10 mg/kg, seguida de duas doses de 5 mg/kg com pelo menos 24 horas de intervalo. O placebo foi administrado como um volume igual de cloreto de sódio a 0,9% (somente um curso de ambos foi administrado).
Resultados
Foram randomizados 653 bebês: 326 para receber ibuprofeno e 327 para receber placebo. A mediana do diâmetro da PCA foi de 2,2 mm. A mediana de IG ao nascimento em ambos os grupos foi de 26 semanas.
Um evento de desfecho primário (óbito ou evolução para DBP moderada ou grave) ocorreu em 220/318 bebês (69,2%) no “grupo ibuprofeno” e 202/318 bebês (63,5%) no “grupo placebo”. No “grupo ibuprofeno”, um único ciclo do fármaco administrado 72 horas após o nascimento resultou na diminuição do tamanho ou resolução da PCA em 55,5% dos pacientes, em comparação com 37,5% no “grupo placebo”. É importante destacar que a administração precoce de ibuprofeno em bebês extremamente prematuros com PCA grande não resultou na melhoria da sobrevivência nem na diminuição do risco de DBP moderada ou grave: entre os bebês que sobreviveram até 36 semanas IG, DBP moderada ou grave ocorreu em 176/274 (64,2%) no “grupo ibuprofeno” e em 169/285 (59,3%) no “grupo placebo”.
Conclusões
O estudo concluiu que o risco de óbito ou DBP moderada ou grave às 36 semanas IG não foi significativamente menor entre os bebês que receberam tratamento precoce com ibuprofeno do que entre aqueles que receberam placebo.
Comentários
Na prática, o uso de ibuprofeno é bastante disseminado em neonatologia com o objetivo de fechamento de PCA. No entanto, o ECR Baby-OSCAR não apoia o uso de ibuprofeno para reduzir a mortalidade ou o risco de DBP em bebês extremamente prematuros com PCA. Penso ser bastante inesperado o fato de que somente 55,5% dos bebês que fizeram ibuprofeno tiveram de fato uma redução no tamanho ou resolução da PCA.
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Autor
Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra
- Gupta S. et al. Trial of Selective Early Treatment of Patent Ductus Arteriosus with Ibuprofen. N Engl J Med. 2024;390(4):314-325. DOI: 10.1056/NEJMoa2305582