Evidência da psicoterapia psicodinâmica para transtornos mentais

Leichsenring et al. conduziram uma revisão guarda-chuva e meta-análise da eficácia de terapias psicodinâmicas (PDT, do inglês psychodynamic therapy) utilizando o modelo de avaliação de tratamentos psicoterápicos empiricamente apoiados (EST do inglês empirically supported psychotherapeutic treatments).

O modelo fundamenta-se em algumas práticas: uso de revisões sistemáticas (meta-análises) ao invés de estudos individuais; foco na qualidade do estudo e no significado clínico para além da significância estatística; avaliação de resultados de eficácia de longo prazo ao invés de curto prazo e resultados funcionais ou relacionados à saúde em conjunto com melhora sintomática; possibilidade de generalização para contextos que não sejam de pesquisa; retirar a ênfase de diagnósticos categóricos e enfatizar síndromes e pacientes diagnosticamente complexos; análise de mecanismos psicopatológicos e terapêuticos para mudança. Além disso, o modelo propõe algumas alterações no sistema GRADE tornando a avaliação da força da recomendação e qualidade das evidências mais rígida.

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Evidência da psicoterapia psicodinâmica para transtornos mentais terapias

Método

A PDT é definida no estudo como “uma família de abordagens psicoterapêuticas tendo em comum o foco na identificação de padrões recorrentes de relacionamento consigo mesmo e com os outros (incluindo o relacionamento terapêutico) e de expressão de emoções, bem como a exploração de padrões defensivos e a discussão de experiências passadas que têm impacto nas experiências presentes da pessoa”. A PDT opera utilizando intervenções de apoio e interpretação: as intervenções interpretativas visam aumentar a consciência da pessoa acerca dos conflitos repetitivos que sustentam seus problemas, enquanto as intervenções de apoio visam fortalecer as capacidades psicossociais (“funções do ego”).

Os transtornos mentais avaliados foram definidos de acordo com os critérios diagnósticos do DSM ou CID (não consta quais edições das classificações no artigo).

O artigo focou em meta-análises de ensaios clínicos randomizados sobre transtornos mentais comuns em adultos publicados nos últimos dois anos onde PDT foi comparada com lista de espera, tratamento usual, pílulas, placebo psicológico, farmacoterapia ou outra forma de psicoterapia, com os controles sendo separados em controles ativos e terapias ativas. Foram incluídos estudos individuais se revisões sistemáticas não estivessem disponíveis para uma área específica de pesquisa ou se um estudo recente não estivesse incluído nas revisões sistemáticas disponíveis.

O desfecho primário foi o tamanho de efeito e o significado clínico na mudança de sintomas alvo dos transtornos avaliados por escalas validadas. Os efeitos secundários (avaliados quando disponíveis) foram os efeitos adversos, melhora no funcionamento, eficácia sob condições do mundo real, custo-efetividade e impacto em minorias.

Resultados

Tamanho de efeito negativo indica superioridade da PDT.

Transtorno Depressivo

Uma metanálise analisando a eficácia da PDT frente a controles e terapias ativas, com 27 ECR (N=3163 pacientes) foi incluída.

PDT foi superior na melhora de sintomas depressivos em todas as situações de controle (g= -0,58 IC 95%: -0,33 a -0,88) – sem evidência de viés de publicação. Comparado com lista de espera somente o tamanho de efeito foi maior (g=-1,14 IC 95% -1,16 a -0,62) e menor comparado com placebo ativo (g=-0,51 IC 95% -0,68 a -0,35).

O tamanho de efeito de -0,58 é equivalente a uma taxa de sucesso de 33% ou um NNT de 3. Tamanhos de efeito maiores que d=±0,24 são sugeridos na literatura como clinicamente significantes.

Comparado com outras terapias ativas, PDT não teve diferença estatisticamente significante quanto a gravidade da depressão (g=-0,01, IC 95% -0,34 a 0,32, n=20, N=2335), diferença que permanece sem significância estatística no seguimento de 2-55 meses g=-0,01, IC 95% -0,31 a 0,29).

Vários estudos cobertos na metanálise mais recente relatam dados de tolerabilidade com nenhum ou poucos eventos adversos. Melhoras no funcionamento não foi avaliada nesta metanálise. A qualidade da evidência foi moderada para PDT vs. terapia ativa e alta para PDT vs. todos os controles.

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Transtornos de Ansiedade

A metanálise incluída compara PDT com controle e terapias ativas, incluindo 17 ECR (N= 1798), avaliando agorafobia com ou sem transtorno do pânico, transtorno do pânico, transtorno de ansiedade social, transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de estresse pós-traumático.

PDT foi superior a todos os controles em reduzir sintomas ansiosos com um grande tamanho de efeito (g=-0,94 IC 95% -1,55 a -0,33), sem evidência de viés de publicação. O tamanho de efeito não diferiu significativamente se o controle foi ativo ou lista de espera.

O tamanho de efeito de -0,72 é equivalente a uma taxa de sucesso de 38% ou um NNT de 2,6.

Comparado com outras terapias ativas, PDT não diferiu estatisticamente com relação a ansiedade (g=-0,01 IC 95% -0,21 a 0,20). Taxas de remissão também não foram estatisticamente significante entre PDT e outras terapias ativas (log odds ratio: 0,12, IC 95% -0,76 a 0,99). No acompanhamento de até um ano após o término do tratamento, os resultados da PDT não diferiram de outras terapias ativas (g=0,08 IC 95% -0,25 a 0,42), bem como no seguimento após um ano após o término da terapia também não houve diferença (g=0,21 IC 95% -0,45 a 0,87).

Vários estudos cobertos na metanálise mais recente relatam dados de tolerabilidade com nenhum ou poucos eventos adversos. Melhoras no funcionamento não foi avaliada nesta metanálise.

A evidência foi classificada como moderada para desfechos principais da PDT nos transtornos de ansiedade e baixa na comparação PDT vs. controles ativos.

Impactos na Prática Clínica

Esta revisão sugere que a psicoterapia psicodinâmica representa uma psicoterapia baseada em evidências para transtornos depressivos e de ansiedade, equiparável em eficácia a outras terapias ativas.

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Autor

Médica pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Residência em Psiquiatria pela Universidade de São Paulo (USP). Mestranda em Psicologia Social pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP). Psiquiatra Assistente do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (HU-USP).

Referências bibliográficas:
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  • Leichsenring, F., Abbass, A., Heim, N., Keefe, J. R., Kisely, S., Luyten, P., Rabung, S., & Steinert, C. The status of psychodynamic psychotherapy as an empirically supported treatment for common mental disorders – an umbrella review based on updated criteria. World psychiatry: official journal of the World Psychiatric Association (WPA). 2023;22(2):286–304. DOI: 10.1002/wps.21104


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