As estatinas reduzem a morbidade e mortalidade cardiovascular de forma significativa e este benefício é ainda maior quando há associação de inibidores de PCSK9, que reduzem ainda mais os níveis de LDL. Os efeitos dessas medicações nas alterações vasculares ainda não foram tão bem estudados e, até o momento, viu-se redução pequena da carga aterosclerótica, mesmo com níveis de LDL tão baixos quanto 40 mg/dL. Assim, pode ser que a redução de eventos se justifique por outros efeitos na placa aterosclerótica e não só no seu volume.
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O estudo PACMAN-AMI, que testou alirocumabe em pacientes com infarto agudo do miocárdio (IAM), encontrou alterações na placa aterosclerótica: redução do volume, redução do componente lipídico e aumento da capa fibrosa. Essas três alterações foram chamadas em conjunto de tripla regressão.
Baseado nesses achados, foi feita uma subanálise desse mesmo estudo com objetivo de avaliar a proporção da ocorrência da tripla regressão, seus principais determinantes e suas implicações prognósticas.
Métodos
O PACMAN-AMI foi estudo multicêntrico, randomizado, duplo cego que incluiu 300 pacientes que realizaram angioplastia para IAM com supra ou sem supra desnivelamento do segmento ST e que tinham também doença aterosclerótica não obstrutiva (entre 20% e 50%) em região proximal de duas artérias não relacionadas ao IAM. Para inclusão, os pacientes deveriam ter LDL mínimo de 125 mg/dL sem estatina ou 70 mg/dL com estatina.
Todos os pacientes receberam estatina de alta potência e foram randomizados para receber alirocumabe 150 mg ou placebo a cada duas semanas. A avaliação intracoronária foi feita com espectroscopia próxima a infravermelha associada a ultrassonografia intracoronária, do inglês NIRS-IVUS, e com tomografia por coerência óptica, do inglês OCT, na avaliação inicial e no seguimento de 52 semanas.
O desfecho primário foi a mudança nas medidas do IVUS e no volume da placa aterosclerótica. Os desfechos secundários foram a mudança na no núcleo lipídico, avaliado por NIRS, e na espessura da capa fibrosa, por OCT. Pacientes com mudanças nos três parâmetros foram classificados como tendo tripla regressão. Os desfechos clínicos foram morte, IAM e revascularização guiada por isquemia.
Resultados
Dos 300 pacientes randomizados, 88,2% tinham a avaliação com todos os exames de imagem e desses, 31,7% tiveram tripla regressão em 52 semanas, sendo 40,8% do grupo alirocumabe e 23% do grupo placebo.
Pacientes com tripla regressão usavam menos betabloqueadores (2,6% x 11,6%) e terapia antiplaquetária (2,6% x 11,6%) na randomização. Do total, 75,1% tiveram redução do volume da placa aterosclerótica, 64,1% tiveram mudanças positivas no núcleo lipídico e 64,9% tiveram aumento da capa fibrosa. No grupo alirocumabe, essas proporções foram de 87,3%, 73% e 68,2% e no grupo placebo de 67,4%, 58,1% e 65,1% respectivamente.
Na avaliação inicial, pacientes com a tripla regressão tinham colesterol total, LDL, não HDL e apolipoproteina B mais altos e, em 12 meses, tiveram maior redução de LDL (diferença entre os grupos de 27,1 mg/dL, p < 0,001), não HDL (diferença entre os grupos 29,2 mg/dL, p < 0,001) e apolipoproteína B (diferença entre os grupos 18,5 mg/dL, p < 0,001) comparado aos que não tiveram tripla regressão.
Na avaliação inicial, a carga aterosclerótica do núcleo lipídico era maior nos pacientes que tiveram tripla regressão, sem diferença no volume da placa e na espessura da capa fibrosa entre os grupos. Na semana 52, houve maior redução do volume da placa e na carga aterosclerótica nos pacientes que tiveram tripla regressão e a espessura da capa fibrosa aumentou mais nos pacientes com tripla regressão. Foram identificados como preditores de tripla regressão a carga aterosclerótica do núcleo lipídico e o uso de alirocumabe.
Em um ano, houve 15,1% de desfechos primários, sendo a incidência menor nos pacientes com tripla regressão que nos sem (8,3% x 18,2%, OR 0,41; IC95% 0,17-0,97). Esse resultado ocorreu às custas de redução de revascularização guiada por isquemia.
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Comentários e conclusão
Esta subanálise avaliou componentes prognósticos relevantes da composição da placa aterosclerótica com novas tecnologias de imagem e encontrou tripla regressão em um terço dos pacientes com IAM tratados com hipolipemiantes potentes.
O alirocumabe foi o preditor mais forte de tripla regressão, associado a maior carga lipídica antes do tratamento. Pacientes com tripla regressão tiveram menos eventos cardiovasculares, principalmente necessidade de nova revascularização.
Sabemos que o uso de alirocumabe leva a maior redução de LDL e estudos prévios já mostraram relação linear entre níveis de LDL e regressão da placa. Este estudo mostrou que níveis muito baixos de LDL com uso de tratamento hipolipemiante intensivo pode reduzir e estabilizar placas de ateroma e, de forma interessante, pacientes com níveis de LDL mais altos no início tiveram maior benefício. A presença de maior alteração no núcleo lipídico no início também foi associada a melhores resultados, independente da medicação utilizada.
Mensagem prática
Assim, o componente lipídico da aterosclerose representa um alvo terapêutico importante e a caracterização da placa de forma invasiva ou até não invasiva (por angiotomografia) pode auxiliar na identificação dos pacientes de maior risco.
Mais estudos são necessários para confirmar esses achados e avaliar as alterações na placa em relação a eventos clínicos específicos, com estudos desenhados especificamente com esta finalidade. Futuramente, com a maior disponibilização desses exames complementares, pode ser que a avaliação individual da placa possa auxiliar na decisão terapêutica.
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Autor
Editora de cardiologia do Portal PEBMED ⦁ Graduação em Medicina pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) ⦁ Residência em Clínica Médica pela UNIFESP ⦁ Residência em Cardiologia pelo Instituto do Coração (InCor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) ⦁ Atualmente atuando nas áreas de terapia intensiva, cardiologia ambulatorial, enfermaria e em ensino médico.
- Biccirè FG, et al.